A NECESSIDADE DE VENCER - OSHO
“Quando um arqueiro atira por diversão
Ele está de posse de toda a sua habilidade.
Se atira para ganhar uma fivela de bronze
Já fica nervoso.
Se atira por um prêmio em ouro
Fica cego
Ou vê dois alvos – ele fica louco.
Sua habilidade não mudou.
Mas o prêmio deixa-o dividido.
Ele se preocupa,
Pensa mais em ganhar do que em atirar.
E a necessidade de vencer exaure suas forças.”
Agora, tente entender o sutra de Chuang Tzu: "A necessidade de vencer". De onde vem essa necessidade – a necessidade de vencer? Todo mundo está em busca da vitória, buscando vencer, mas porque surgiu essa necessidade de vencer?
Você não está de forma alguma consciente de que já é vitorioso, que a vida já aconteceu a você. Você já é um vencedor e nada mais é possível, tudo o que poderia acontecer já aconteceu com você. Você já é um imperador e não há nenhum outro reino a ser conquistado. Mas você não reconheceu isso, você não conhece a beleza da vida que já lhe aconteceu. Você não conhece o silêncio, a paz, a felicidade, que já estão presentes.
Porque você não está ciente desse reino interior, você sempre sente que algo é necessário, alguma vitória, para provar que você não é um mendigo.
Qual é a necessidade de vencer? Você tem de provar a si mesmo. Você se sente tão inferior por dentro, você se sente tão ocioso e vazio – por dentro você se sente como se fosse um ninguém, por isso essa necessidade de provar. Você tem que provar que é alguém, e, a menos que você tenha provado isso, como pode ficar em paz?
Há duas maneiras, e tente entender que estas são as duas únicas maneiras. Uma delas é ir para fora, voltar-se para fora, e perceber que você é ninguém. Se você sair por aí, nunca será capaz de provar que é alguém. A necessidade permanecerá; na verdade, pode aumentar. Quanto mais você provar, mas vai se sentir como um mendigo; você vai se sentir assim sempre. Porque o mero ato de provar aos outros que você é alguém não faz de você alguém. No fundo, o sentimento de ser ninguém permanece. Ele continua açoitando o seu coração – o sentimento de que você é ninguém.
Conquistar reinos não vai ajudar, porque os reinos não vão entrar dentro de você e preencher a lacuna. Nada pode entrar em você. O que está fora permanecerá fora; o que está dentro permanecerá dentro. Não há um encontro. Você pode ter toda a riqueza do mundo, mas como você pode trazê-la para dentro para preencher o seu vazio? Não, mesmo com toda riqueza do mundo você ainda vai se sentir vazio, mais até, porque agora o contraste vai estar diante de você. É por isso que Buda abandonou seu palácio: ver toda a riqueza e ainda sentir o vazio interior, perceber que tudo é inútil.
Outra maneira é se voltar para dentro – não para tentar se livrar deste sentimento de ser ninguém, mas para percebê-lo. Isso é o que Chuang Tzu está dizendo: torne-se um barco vazio, apenas se volte para dentro e perceba que você é ninguém. No momento em que você perceber que é ninguém, você explode numa nova dimensão, porque, quando alguém percebe que é ninguém, também percebe que é tudo.
Você não é alguém, porque você é tudo. Como pode o tudo ser alguém? "Alguém" sempre será uma parte. Deus não pode ser alguém porque ele é tudo, ele não pode possuir nada porque ele é o todo. Apenas os mendigos possuem, porque as posses têm limitações. As posses não podem ser ilimitadas. “Ser alguém” tem um limite, o “ser alguém” não pode ser sem limites, não pode ser infinito. “Ser ninguém” é infinito, assim como ser tudo.
Na verdade, ambos são a mesma coisa. Se você está se movendo para fora, você vai sentir seu reino interior como um ninguém. Se você está se movendo para dentro, você vai sentir o mesmo ninguém como tudo. É por isso que Buda diz que shunya, o vazio absoluto, é brahman. Ser ninguém é perceber que você é tudo. Perceber que você é alguém é perceber que você não é tudo. E nada menos servirá.
Assim, a outra maneira é ir para dentro de si, não para lutar com esse sentimento de ser ninguém, não para tentar preencher esse vazio, mas para percebê-lo e tornar-se uno com ele. Seja o barco vazio e, então, todos os mares serão seus. Então você pode passar para o desconhecido, então não existirá qualquer impedimento para esse barco, ninguém pode bloquear seu caminho. Nenhum mapa é necessário. Esse barco avançará para o infinito. Agora todos os lugares são o objetivo, mas a pessoa tem que ir para dentro.
A necessidade de vencer é para provar que você é alguém, e a única maneira que conhecemos de provar isso é provar aos olhos dos outros, porque os olhos deles se tornam reflexos.
Qual é a necessidade de vencer? O que você quer provar? Aos seus próprios olhos você sabe que você é um nada, coisa nenhuma, e esse nada dói no seu coração. Você sofre porque você não é nada – então você tem que provar a si mesmo aos olhos dos outros. Você tem que criar uma opinião na mente das outras pessoas de que você é alguém, de que não é um nada. E olhando nos olhos delas você vai reunir opiniões, a opinião pública, e por meio dela vai criar uma imagem. Essa imagem é o ego, não é o seu verdadeiro eu. É uma glória refletida, não é a sua própria – ela vem dos outros.
Este tipo sempre vai ter medo dos outros, porque eles podem pegar de volta tudo o que deram. Um político está sempre com medo do público, porque eles podem pegar de volta tudo o que lhe deram. É só emprestado; seu eu é um eu emprestado. Se você tem medo dos outros, você é um escravo, você não é um mestre.
Essa é a diferença entre o eu e o ego – o ego é um eu emprestado, ele depende dos outros, da opinião pública. O eu é o seu ser autêntico, não é emprestado, ele é seu. Ninguém pode pegá-lo de volta.
Veja, Chuang Tzu disse palavras bonitas:
“Quando um arqueiro atira por diversão
Ele está de posse de toda a sua habilidade”
Quando um arqueiro atira por diversão, ele está de posse de toda a sua habilidade. Quando você está brincando, não está tentando provar que você é alguém. Está à vontade, contente. Durante a brincadeira, apenas por diversão, você não está preocupado com o que os outros pensam de você.
Você já viu um pai numa luta simulada com o filho? Ele vai ser derrotado. Ele vai se deitar e a criança vai se sentar sobre o seu peito e rir, e dizer: “Eu sou o vencedor!” – E o pai vai ficar feliz. É só diversão. Na diversão você pode ser derrotado e ficar feliz. A diversão não é uma coisa séria, não está relacionada com o ego. O ego é sempre sério.
Então, lembre-se, se você é sério, você sempre está num tumulto interior. Um santo está sempre brincando, como se atirasse por diversão. Ele não está interessado em atirar num alvo específico, ele está apenas se divertindo.
Um filósofo alemão, Eugene Herrigel, foi ao Japão para aprender a meditar. No Japão eles usam todos os tipos de artifício para ensinar a meditar, incluindo o arco e a flecha. Herrigel era um arqueiro perfeito, acertava cem por cento. Nunca errava o alvo. Então ele procurou um mestre para aprender a meditar através do arco e da flecha, porque ele já era hábil nisso.
Depois de três anos Herrigel começou a sentir que aquilo era um desperdício de tempo, porque o mestre continuava insistindo que ele não deveria atirar. Ele dizia a Herrigel: “Deixe a flecha se lançar por si só. Você não deve estar presente quando aponta a flecha, deixe-a fazer ela mesma a pontaria.”
Era um absurdo. Para um ocidental em particular, era um completo absurdo: “O que quer dizer com isso, deixar que a flecha se lance por si só? Como uma flecha pode se atirar por si só? Eu tenho que fazer alguma coisa.” E ele continuava. E nunca errava o alvo.
Mas o mestre dizia: “O alvo não é o alvo coisa nenhuma. Você é o alvo. Eu não estou vendo se você está atingindo o alvo ou não. Essa é uma habilidade mecânica. Eu estou olhando para você, para ver se você está presente ou não. Atire para se divertir! Divirta-se, não tente provar que nunca perde o alvo. Não tente provar o ego. Ele já está lá, você está lá, não há necessidade de prova-lo. Fique à vontade e permita que a flecha atire a si mesma.”
Herrigel não conseguia entender. Ele tentou e tentou e disse repetidas vezes: “Se minha pontaria é cem por cento correta, por que você não me dá o certificado?”
A mente ocidental está sempre interessada no resultado final e a oriental está sempre interessada no começo, não no final – no arqueiro, não no alvo. O resultado final não tem importância. Então o mestre dizia: “Não!”
Então, completamente decepcionado, Herrigel pediu para ir embora. Ele disse: “Então eu terei que ir. Três anos é muito e não ganhei nada com isso e você continua dizendo não, e continua dizendo que ainda sou o mesmo.”
No dia em que estava para sair, ele tinha acabado de se despedir. O mestre estava ensinando outros discípulos. Naquela manhã, Herrigel não estava interessado em nada; ele estava partindo, tinha desistido de todo o projeto. Então, estava apenas esperando ali até que o mestre estivesse desocupado. Ele se despediria e iria embora.
Sentado em um banco, ele olhou para o mestre, pela primeira vez. Pela primeira vez em três anos ele olhou para o mestre. Na verdade, ele não estava fazendo nada; era como se a flecha estivesse atirando a si mesma. O mestre não estava sério, ele estava brincando, ele estava se divertindo. Não havia ninguém interessado no alvo.
O ego é sempre orientado para o alvo. A diversão não tem meta a alcançar, o divertimento está no início, quando a flecha deixa o arco. Se ela dispara, isso é acidental; se atinge o alvo, isso não é relevante; se atinge o alvo ou não, essa não é a questão. Mas, quando a flecha deixa o arco, o arqueiro deve estar brincando, se divertindo, sem se levar a sério. Quando está sério, você está tendo; quando não está sério, você está relaxado e, quando você está relaxado/à vontade, você está presente. Quando você está tenso, o ego está presente, você está entorpecido.
Pela primeira vez Herrigel olhou – porque agora ele não estava interessado. Aquilo não era mais da conta dele, ele tinha desistido da coisa toda. Ele estava indo embora, então não havia mais por que levar tudo a sério. Ele tinha aceitado o seu fracasso, não havia nada para ser provado. Ele olhou e, pela primeira vez, seus olhos não estavam obcecados com o alvo.
Ele olhou para o mestre e era como se a flecha estivesse atirando a si mesma do arco. O mestre estava só dando energia a ela, ele não estava atirando. Não estava fazendo nada, a coisa toda era feita sem esforço. Herrigel olhou e pela primeira vez entendeu o que significava.
Como que enfeitiçado, ele se aproximou do mestre, tomou o arco da sua mão e recuou a flecha. O mestre disse: “Você compreendeu. Isso é o que eu tenho dito para você fazer há três anos.” A seta ainda não tinha deixado o arco quando o mestre disse: “Concluído: o alvo foi atingido.” Agora ele estava se divertindo, ele não estava sério, ele não estava preocupado com o objetivo.
Essa é a diferença. A diversão não visa um objetivo, ela não tem objetivo. A diversão é apropria meta, o valor intrínseco, nada mais. Você se divertiu, é o que basta. Não há nenhum propósito, você brincou. Isso é tudo.
Quando um arqueiro está atirando por diversão, ele está de posse de toda a sua habilidade. Quando você está atirando para se divertir, você não está em conflito. Não há dois, não há tensão, sua mente não vai a lugar nenhum. Sua mente não está indo – então você está inteiro. Então a habilidade está lá.
Dizem de um pintor zen, um mestre zen... Ele estava fazendo um desenho, um projeto, para um pagode novo, um novo templo. Ele tinha o hábito de manter seu principal discípulo ao seu lado. Ele fazia o desenho, olhava para o discípulo e perguntava: “O que você acha?”.
E o discípulo dizia: “Não é digno de você.” Então ele o jogava fora.
Isso aconteceu 99 vezes. Três meses se passaram e o rei estava sempre perguntando quando o projeto seria concluído, quando o trabalho poderia começar. E um dia aconteceu: o mestre estava fazendo o projeto e a tinta secou, então ele disse ao discípulo para sair e preparar mais tinta.
O discípulo saiu e, quando voltou, ele disse: “O que? Você fez isso! Mas por que durante três meses não conseguiu fazer?”
O mestre disse: “Por sua causa. Você estava sentado ao meu lado e eu estava dividido. Você estava olhando para mim e eu estava preocupado com o resultado, não era divertido. Quando você ficou ausente, eu relaxei. Senti que não havia ninguém ali, fiquei inteiro. Eu não fiz este projeto, ele veio por si só. Durante três meses, ele não veio porque era eu quem o fazia.”
Quando um arqueiro está atirando por diversão, ele está de posse de toda a sua habilidade... porque todo o seu ser está disponível. E quando todo o seu ser está disponível, você tem uma beleza, uma graça, uma qualidade totalmente diferente de ser. Quando você está dividido, sério, tenso, você é feio. Você pode ter sucesso, mas seu sucesso vai ser feio. Você pode provar para alguém que você é alguém, mas você não está provando nada, você está simplesmente criando uma imagem falsa. Mas, quando você é total, descontraído, inteiro, pode ser que ninguém conheça você, mas você é.
E essa totalidade é a bênção, a bem-aventurança, a beatitude, que acontece a uma mente meditativa, que acontece na meditação. Meditação significa totalidade.
Então, lembre-se, a meditação deve ser divertida, não deve ser um peso, um trabalho. Você não deve fazê-la como um homem religioso, você deve fazê-lo como um jogador. Como quem joga para se divertir. Você deve ser como um esportista, não como um empresário. Deve ser divertido, então toda a sua habilidade estará disponível, então ela irá florescer por si só. Você não será necessário. Nenhum esforço será necessário. Simplesmente todo o seu ser tem de estar disponível, toda a sua energia tem de estar disponível. Então, o florescimento vem por si só.
“Se atira para ganhar uma fivela de bronze, já fica nervoso...”
Se ele está numa competição apenas para ganhar um fivela de bronze, se algo deve ser realizado, um resultado é necessário, ele já fica ervoso, com medo. O medo vem: “Será que vou ter sucesso ou não?” Ele fica dividido. Uma parte da mente diz: “Talvez você tenha sucesso”; a outra parte diz: “Talvez você falhe.” Agora nem toda a sua habilidade está disponível, agora ele é meio a meio. E sempre que você está dividido, todo o seu ser se torna feio e doente. Você fica desassossegado.
“Se atira por um prêmio em ouro, fica cego ou vê dois alvos – ele fica louco...”
Vá ao mercado e observe as pessoas que estão atrás de outro. Elas são cegas. O outro cega mais homens do que qualquer outra coisa, o ouro ofusca os olhos completamente. Quando você está muito preocupado em ter sucesso, em chegar a um resultado, está muito ambicioso, quando você está muito obcecado pela medalha de ouro, você fica cego e começa a ver dois alvos. Você fica tão embriagado que começa a ver dois alvos.
Todo mundo está louco, fora da própria mente. Não são apenas os loucos que estão fora da mente, você também está fora da sua mente. A diferença é apenas de grau, não de qualidade; um pouco mais e a qualquer momento você pode cruzar a linha divisória. É como se você estivesse a 99 graus. Cem graus e você entra em ebulição, atravessou a fronteira. A diferença entre aqueles que estão em manicômios e aqueles que estão fora é só de quantidade, não de qualidade. Todo mundo está fora da própria mente, porque todo mundo está atrás de resultados, metas, propósitos. Algo tem que ser alcançado. Então, vem o nervosismo, o tremor interior, então você não pode ter quietude interior. E, quando você treme por dentro, o alvo se torna dois, ou mesmo quatro ou oito – então é impossível se tornar um arqueiro.
O arqueiro perfeito é sempre aquele que está se divertindo.
O homem perfeito vive a vida como se ela fosse uma diversão, uma brincadeira.
Veja a vida de Krishna. Se Chuang Tzu o tivesse conhecido, teria sido uma beleza. A vida de Krishna é divertida. Buda, Mahavira, Jesus, de um modo ou de outro parecem um pouco sérios, como se algo tivesse que ser alcançado – o moksha, o nirvana, o reino de Deus. Mas Krishna é absolutamente sem propósito – o tocador de flauta que vive apenas para se divertir, para dançar com as garotas, divertindo-se, cantando. Nenhum lugar para ir, está tudo aqui, então por que se preocupar com o resultado? Tudo está disponível agora, por que não aproveitar isso?
Se divertir-se é a indicação de um homem perfeito, Krishna é o homem perfeito. Na Índia, nunca chamamos a vida dele de Krishna charitra, seu caráter, nunca a chamamos assim. Nós a chamamos de Krishna leela, a sua diversão. Não é um caráter, não tem um propósito; é absolutamente despropositado.
É como uma criança pequena. Você não pode perguntar: “O que você está fazendo? Você não pode perguntar: “Qual é o significado disso?” Ela está se divertindo apenas correndo atrás das borboletas. O que ela vai atingir apenas pulando ao sol? A que fim esse esforço levará? A nenhum outro lugar! Ela não vai a lugar algum. Nós a chamamos de infantil e nos consideramos maduros, mas eu lhe digo que, quando você estiver realmente maduro, vai voltar a ser criança. Então, sua vida voltará a ser divertida. Você vai apreciá-la, cada pedacinho dela, você não vai ser tão sério. Um riso profundo vai se espalhar por toda sua vida. Será mais como uma dança e menos como um negócio; vai ser mais como cantar, cantarolar no banheiro, menos como fazer contas no escritório. Não vai ser matemática, vai ser apenas diversão.
“A habilidade dele não mudou.
Mas o prêmio deixa-o dividido.
Ele se preocupa,
Pensa mais em ganhar do que em atirar.
E a necessidade de vencer exaure suas forças.”
Se você parece tão impotente, tão sem forças, indefeso, a culpa é toda sua. Ninguém está exaurindo suas forças. Você tem infinitas fontes de poder, inesgotáveis, mas você parece esgotado, como se a qualquer momento fosse cair, sem que lhe reste nenhuma energia.
Para onde estão indo todas essas energias? Você está criando um conflito dentro de si mesmo – a sua habilidade é a mesma.
“A habilidade dele não mudou. Mas o prêmio deixa-o dividido. Ele se preocupa...”
Eu ouvi uma história. Aconteceu numa aldeia... Um homem pobre, filho de um mendigo, era jovem e saudável – tão jovem e tão saudável que, quando o elefante do rei passava pela aldeia, ele simplesmente agarrava o rabo do elefante e o animal não era capaz de se mover.
Às vezes era muito embaraçoso para o rei, porque ele ficava sentado sobre o elefante e todo o mercado se reunia e as pessoas riam. E tudo por causa do filho de um mendigo.
O rei pediu ao seu primeiro-ministro: “É preciso fazer alguma coisa. Isso é um insulto. Fiquei com receio de passar por aquela aldeia, e o menino às vezes visita outras aldeias também. Em qualquer lugar ele pode agarrar a cauda do elefante e ele não se moverá. Ele é tão forte, faça alguma coisa para esgotar sua energia.”
O primeiro-ministro disse: “Vou ter de consultar um sábio, porque eu não sei como esgotar sua energia. Não há nada para esgotar sua energia, porque ele é um mendigo. Se ele tivesse uma loja, sua energia poderia ser exaurida. Se ele estivesse trabalhando como escriturário num escritório, a energia seria descarregada. Se ele fosse professor numa escola primária, sua energia poderia ser esgotada. Mas ele não tem nada para fazer. Ele vive para se divertir, e as pessoas o adoram e lhe dão comida e leite, por isso nunca lhe falta comida. Ele está feliz, ele come e dorme. Por isso é difícil, mas eu vou.”
Então ele foi procurar um velho sábio. O Sábio lhe disse: “Faça uma coisa. Vá e diga ao rapaz que você vai lhe dar um rúpia de ouro todos os dias se ele lhe prestar um pequeno serviço – e o serviço é muito simples. Ele tem que ir ao templo da aldeia e acender uma lamparina. Ele tem apenas de acender uma lamparina, isso é tudo. E você vai lhe dar uma rúpia de ouro todos os dias.
O primeiro-ministro disse: “Mas como isso vai ajudar? Isso pode torna-lo ainda mais entusiasmado. Ele vai ter uma rúpia e vai se sentir cheio de energia. Ele nem mesmo se preocupará em pedir esmolas.”
O sábio disse: “Não se preocupe, basta fazer o que eu digo.”
Isso foi feito, e na semana seguinte, quando o rei passou, o menino tentou, mas não conseguiu, não conseguiu parar o elefante. Ele foi arrastado por ele.
O que aconteceu? Surgiu a preocupação, surgiu a ansiedade. Ele tinha que lembrar, durante 24 horas por dia ele tinha que lembrar que tinha de ir ao templo, todas as noites, e acender a lamparina. Isso se tornou uma preocupação, que dividiu todo o seu ser. Mesmo durante o sono, ele começou a sonhar que era noite: “O que você está fazendo? Vá e acenda a lamparina e pegue a sua rúpia.”
Então ele começou a guardar as rúpias de ouro – agora são sete, agora oito. Então começou a calcular que, dali a certo tempo, ele teria cem rúpias de ouro – e que essa quantia ia aumentar para duzentas. Entrou a matemática, acabou a diversão. E ele tinha apenas uma pequena coisa a fazer, acender uma lamparina. Apenas um único minuto, nem mesmo um minuto, apenas uma coisa momentânea – mas tornou-se uma preocupação. E isso exauriu toda a sua energia.
Se você está esgotado não é de admirar que a sua vida não esteja divertida. Você tem tantos templos e tantas lamparinas para acender, tantos cálculos na sua vida, que ela não pode ser um divertimento.
A habilidade dele não mudou – a habilidade é a mesma, mas o arqueiro, quando está atirando para se divertir, tem toda a sua habilidade disponível. A habilidade ele não mudou. Mas o prêmio o dividiu. Ele se preocupa. Surgiu a ansiedade, surgiu o nervosismo. Ele pensa mais em ganhar, agora não está preocupado em disparar a flecha. Agora a questão é como ganhar, e não como disparar a flecha. Ele passou do início ao fim. Agora o meio não é importante, o fim é importante, e sempre que o fim é importante a energia fica dividida, porque tudo o que pode ser feito é para ser feito com o meio, não com o fim. Os fins não estão em suas mãos.
No Gita, Krishna diz a Arjuna: "Não se preocupe com o fim, com o resultado. Basta fazer tudo o que é para ser feito aqui e agora e deixe o resultado para Mim, para a existência. Não pergunte o que vai acontecer, você simplesmente faz tudo o que é para ser feito. Fique preocupado com o meio e não pense no fim. Não seja orientado para os resultados."
Essa situação é bela e vale a pena considerar as frases de Chuang Tzu, porque Arjuna era um arqueiro, o maior arqueiro que a Índia já produziu. Ele foi o arqueiro perfeito.
Mas o fim entrou em sua mente. ele nunca tinha se preocupado, nunca tinha acontecido antes. Sua arte com o arco era perfeita, sua habilidade era total, absoluta, mas, vendo aquele grande cerco de Kurukshetra, dois exércitos se defrontando, ele ficou preocupado. Qual era a preocupação? Era que ele tinha amigos em ambos os lados. Era um assunto de família, uma guerra entre primos e irmãos, então todo mundo estava ligado. Aqueles que estavam do outro lado também tinham parentesco com os deste lado. Todas essas famílias e parentes estavam divididos, e estavam uns contra os outros – era uma guerra rara, uma guerra familiar.
Krishna estava lutando ao lado de Arjuna, mas seu exército estava lutando do outro lado. Krishna dissera: "Vocês me amam tanto assim que terão que dividir meio a meio. Um lado pode ter a mim, e o outro lado pode ter os meus exércitos."
Duryodhana, o líder do outro lado, era tolo. Ele pensou: O que vou fazer com Krishna sozinho – e seu exército é tão grande. Então ele disse: "Eu vou escolher o seu exército."
Então, Krishna estava com Arjuna e Arjuna estava feliz, porque um Krishna é mais do que o mundo inteiro. O que podem fazer os exércitos – pessoas inconscientes, adormecidas? Um homem desperto vale muito mais.
Krishna tornou-se de grande ajuda quando Arjuna ficou confuso e sua mente, dividida. No Gita dizem que, ao olhar para esses dois exércitos, ele ficou perplexo. E estas são as palavras que ele falou a Krishna: "Minha energia está esgotada. Sinto-me nervoso, impotente, não tenho mais forças" – e ele era um homem de habilidade perfeita, um arqueiro perfeito.
O seu arco é conhecido como gandiva. Ele disse: "O gandiva parece muito pesado para mim. Fiquei impotente, meu corpo está dormente, e eu não consigo pensar e não consigo ver. Tudo ficou confuso, porque são todos meus parentes e vou ter que matá-los. Qual será o resultado? Carnificina, tantas pessoas mortas, e o que vou ganhar com isso? Um reino sem valor? Eu não estou interessado em lutar, o preço é alto demais. Eu gostaria de fugir e me tornar um sannyasin, um renunciante, para ir para a floresta e meditar. Isto não é para mim. Minha energia está esgotada."
Krishna disse a ele: "Não pense no resultado. Não está em suas mãos. E não pense que você é o realizador, porque, se você for o realizador, então o fim está em suas mãos. O realizador é sempre o divino, e você é apenas um instrumento. Preocupe-se com o aqui e o agora, com o meio, e deixe o fim para mim. Eu lhe digo, Arjuna, que essas pessoas já estão mortas, elas estão fadadas a morrer. Você não vai matá-las. Você é apenas o instrumento para revelar-lhes o fato de que elas já foram assassinadas, já estão mortas. Até onde eu posso ver, vejo-as mortas. Elas chegaram ao ponto em que a morte acontece – você é apenas um instrumento."
O sânscrito tem uma palavra bonita, não há equivalente em inglês ou em português: é nimitta. Nimitta significa que você não é o realizador, você não é a causa, nem mesmo uma das causas, você é apenas o nimitta. Você é só como um carteiro – o carteiro é o nimitta. Ele chega e entrega uma carta para você. Se a carta contém insultos, você não se zanga com ele. Você não diz: "Por que você me trouxe esta carta?" O carteiro não está preocupado, ele é o nimitta. Ele não escreveu a carta, ele não fez nada, não está preocupado com ela. Ele apenas cumpriu o seu dever. Você não vai ficar zangado com ele. Você não vai dizer: "Por que você trouxe esta carta para mim?"
Krishna disse a Arjuna: "Você é como um carteiro, você tem que entregar a morte para elas. Você não é o assassino; a morte vem do divino. Elas já a obtiveram., portanto, não se preocupe. Se você não for matá-las, outra pessoa fará isso." Se este carteiro não fizer isso, então alguém mais vai entregar a carta. Não é uma questão de saber se você vai estar lá ou não, ou se está de férias ou doente, e a carta não será entregue. Um carteiro substituto fará isso. Mas a carta tem de ser entregue. Portanto, não se incomode, não fique preocupado desnecessariamente; você é apenas um instrumento. Esteja preocupado com o meio, não pense no fim, porque, se você pensar no fim, a sua habilidade está perdida, você fica dividido.
E essas foram as palavras de Krishna: "É por isso que você está se sentindo tão esgotado, Arjuna. Sua energia não foi a lugar nenhum. Tornou-se uma consciência – então você está dividido. Você está lutando consigo mesmo. Uma parte diz vá em frente, outra parte diz que isso não é bom. Sua integridade se perdeu. E sempre que a totalidade se perde, você se sente impotente."
Um homem tão poderoso como Arjuna diz: "Eu não posso carregar este gandiva, este arco é muito pesado para mim. Fiquei nervoso. Eu sinto medo, um medo profundo, uma ansiedade cresceu em mim. Eu não posso lutar."
A habilidade é a mesma, nada mudou, mas a mente está dividida. Sempre que você está dividido você fica sem forças, quando você fica indiviso você é poderoso. Os desejos dividem você, a meditação não o divide. Os desejos o levam para o futuro, a meditação traz você para o presente.
Lembre-se disto como uma conclusão: não se mova para o futuro. Sempre que você sentir a sua mente indo para o futuro, volte para o presente imediatamente. Não tente completar o salto. Imediatamente, no momento em que você pensar, no momento em que se der conta de que a mente foi para o futuro, para o desejo, volte ao presente. Fique à vontade.
Você vai fracassar várias e várias vezes. Muitas e muitas vezes você não vai conseguir, porque este se tornou um hábito arraigado, mas mais cedo ou mais tarde, cada vez mais, você vai ficar à vontade. Então a vida fica divertida, vira um brincadeira. E então você fica tão cheio de energia que ela transborda de você – uma enxurrada de vitalidade. E essa enxurrada é felicidade.
Sem forças, esgotado, você não pode estar em êxtase. Como pode dançar? Para dançar, você vai precisar de uma energia infinita. Exaurido, como você pode cantar? Cantar é sempre um transbordamento. Morto como você está, como pode orar? Somente quando você está totalmente vivo um agradecimento brota do seu coração, uma gratidão. Essa gratidão é a oração.
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