sábado, 21 de março de 2009

DEVE-SE CONSULTAR VIDENTES?

Deve-se Consultar Videntes?

Fonte: Omraam Mikhaël Aïvanhov, Acerca do Invisível, Edições Prosveta, Lisboa, 1988.



Muitas pessoas imaginam que a espiritualidade consiste tão somente em ler alguns livrinhos sobre ocultismo, em assistir a algumas sessões espíritas e em consultar clarividentes para que estes(as) lhes revelem o seu futuro ou as suas vidas anteriores. Ah, isso eles encontrarão, clarividentes é o que por aí não falta! Existem milhares e milhares de indivíduos que se dizem médiuns, videntes extraordinários, e que anunciam nos jornais os seus horóscopos, os seus talismãs e as suas jóias, que vos trarão tudo: a felicidade, a riqueza, o amor, a sorte. Eu acredito que existem grandes clarividentes no mundo, mas a maioria, nem me falem neles!

Sinto-me feliz por a ciência oficial começar a admitir que na terra existem criaturas que possuem faculdades de percepção extra-sensorial, e a estudá-las. Mas, na realidade, para mim a questão não está em duvidar ou acreditar, mas em encontrar os melhores métodos de trabalho para avançar na vida espiritual... Os melhores métodos significa os menos perigosos, os mais eficazes, talvez os mais longos, mas os mais duradouros. O que é triste é que as pessoas são apressadas, não têm paciência nem confiança para enveredarem por uma via luminosa, mais lenta, mas mais segura. Têm pressa, querem tornar-se clarividentes assim como poderiam tornar-se "pedicure" ou "manicure", e logo que obtêm um pequeno resultado fazem um grande alarde disso para atrair clientela, e é assim que induzem muita gente ao erro, aproveitando-se do fato de o comum das pessoas não ter discernimento e acreditar em quase tudo.

Quantos homens e mulheres não decidiram exercer a profissão de clarividentes, de médiuns, porque são incapazes de fazer outra coisa! Conheci muitos assim. Durante anos vi-os experimentar uma profissão, depois outra, mas nada resultava; e, um dia, eu vinha a saber que se tinham tornado clarividentes, cartomantes, radiestesistas... Eu ficava estupefato. As pessoas vivem de qualquer modo, não praticam nenhuma disciplina, e são clarividentes! Eu não digo que não tenham umas pequenas faculdades e uns ligeiros dons psíquicos, sim, um pouco de intuição, um pouco de sensibilidade ao mundo invisível, mas têm sobretudo muita habilidade e muito descaramento. Elas compreendem que os humanos têm necessidade de ser sossegados, lisongeados, e então dizem-lhes aquilo que eles querem ouvir.

Algumas vezes eles(as) até nem vêem nada, mas pra não decepcionar aqueles que as consultam, para não perderem o prestígio, ou mesmo, muito simplesmente para não perderem o dinheiro, acabam dando respostas vagas, tentando não se comprometer. Não existem muitos videntes honestos que vos digam francamente: "Desculpe, mas hoje não posso dizer-lhe nada. Não vejo nada. Venha outra hora". Não, eles(as) fingem. No início, é claro, as pessoas duvidam um pouco daquilo que lhes dizem. Mas dá-lhes tanto prazer ouvir dizer que vão encontrar finalmente o homem ou a mulher da sua vida, receber uma herança ou satisfazer todas as suas ambições! E se isso não acontece, não há problemas, elas continuam à espera... Ao passo que se alguém lhes disser que terão de enfrentar dificuldades, provações, ficarão sem vontade de o consultar, mesmo que estas se realizem: têm a impressão de que esse clarividente não é benéfico para elas e voltam àquele que lhes prediz todos os sucessos. Se as magníficas previsões não se realizam, vão consultá-lo de novo para lhe perguntar o que se passou. "Foi simplesmente retardado por causa desta ou daquela posição dos astros", diz o clarividente para os sossegar, "mas vai acontecer, tenha paciência"... E eis de novo a esperança, eis de novo a alegria.

Sim, é assim... Então, de quem é a culpa? Daqueles que vão consultar os clarividentes, claro. Uma vez que têm tanta necessidade de que lhes contem histórias, as pessoas encontrarão sempre alguém muito bom, muito caridoso, que terá prazer em contar-lhas. Quanto aos ditos clarividentes que se afirmam capazes de aconselhar os outros, de responder às suas questões sobre o passado, o presente e o futuro, e resolver os seus problemas, como é possível eles não sentirem que correm o risco de fazer as pessoas perderem-se? Que responsabilidade! E por que fazem isso? Pelo dinheiro? Pelo prestígio?... Pois bem, devem saber que o mundo invisível não gosta de que se sirvam dele desse modo e castigá-los-á.

Eu não nego, repito, que certas pessoas tenham um dom, mas esse dom não as coloca ao abrigo das fraquezas e também não as protege das entidades tenebrosas que vêm visitar todos aqueles que não sabem resistir às tentações, aos seus desejos inferiores. Pode-se ser clarividente e, a par disso, dar mostras de uma moralidade duvidosa. Como se pode ser poeta, músico ou filósofo e viver mais ou menos como um animal? Certas pessoas possuem o dom da clarividência porque numa outra encarnação fizeram os esforços necessários para o obter; e como no presente se deixam conduzir pela suas tendências inferiores, tudo se manifesta conjuntamente: as suas fraquezas, os seus vícios e o seu dom de clarividência. Será assim até perderem esse dom, como perderão também o dom da poesia, da música ou da filosofia todos aqueles que não tiverem sabido trabalhar interiormente para o conservar. Aliás, o dom desses clarividentes não será verdadeiramente notável se eles não possuirem outras qualidades. Portanto, atenção!: se quiserdes mesmo consultar clarividentes, ao menos que não seja uma pessoa qualquer.

Gostaria de chamar a vossa atenção para o seguinte: muitas pessoas vão consultar clarividentes e pôem questões para as quais elas mesmas encontrariam a resposta se utilizassem a sua própria inteligência, o seu juízo e o seu bom senso. Têm tantos indícios na sua frente, diante dos seus olhos, mas não os vêem, não os compreendem, e para serem esclarecidas irão consultar videntes, radiestesistas, cartomantes. Para que servem os olhos, os ouvidos e o cérebro que o Senhor deu a cada um se se passa a vida a interrogar os outros?

Aliás, por que é que se vai fazer perguntas aos outros? Para conhecer a verdade? Nem sempre: muitas vezes até é o contrário, vai-se colocar questões para se ser encorajado a fazer o mal. Por exemplo: quantos homens casados e quantas mulheres casadas, que têm vontade de se separar do seu cônjuge para viver com outra pessoa que lhes agrada mais, não irão consultar uma clarividente na esperança de que ela lhes diga: "Sim, sim, faz bem, é com ele (ou com ela) que encontratá a sua felicidade". A maior parte das vezes é o que a pretensa clarividente responde. Ao passo que se consultarem uma outra clarividente, a verdadeira, a única que vê realmente claro - a sua natureza superior - poderiam ouvir a sua voz dizer-lhes: "Meu filho, atenção, é grave abandonar uma família, tens deveres para com ela. Reflete bem, talvez um dia venhas a lamentar isso". Mas as pessoas não têm nenhum desejo de ouvir esta voz interior, preferem a de qualquer pessoa estranha, desde que ela as encoraje a satisfazer os seus desejos.

Alguns dirão: "Mas nós temos necessidade de consultar videntes para conhecer o nosso futuro, pois nunca sabemos o que este nos reserva e ficamos inquietos. É isso o que nos preocupa". De acordo, mas para conhecer o vosso futuro não precisais de clarividentes. É tão fácil conhecerdes o vosso futuro! Evidentemente, não no que diz respeito à profissão, ao casamento, aos ganhos ou às perdas de dinheiro, que, aliás, não são o mais importante. Mas o essencial, quer dizer, saber se avançareis no caminho da evolução, se sereis livres, felizes, se estareis ou não na luz, na paz, isso sim, é muito fácil, e posso comprová-lo.

Se tiverdes um amor irresistível por tudo quanto é elevado, nobre, justo, belo, se trabalhardes de todo o coração, em plena consciência e com toda a vontade para atingir e realizar isso, o vosso futuro estará traçado: um dia vivereis nas condições que correspondem às vossas aspirações, ao vosso ideal. Eis o que há de essencial a saber sobre o vosso futuro. Tudo o resto, as posses, a glória, as relações com tal homem ou tal mulher, e mesmo a saúde, são coisas secundárias porque passageiras, tudo isso vos pode ser dado ou retirado. Um dia, nada vos restará, de fato, além daquilo que corresponde exatamente às aspirações da vossa alma e do vosso espírito.

Se a maior parte dos humanos tem um destino medíocre é porque não sabem manter neles a orientação correta: oscilam entre a luz e as trevas e o seu futuro é sempre incerto. Portanto, de ora em diante esforçai-vos por canalizar todas as vossas energias e por as orientar em direção ao mundo luminoso da harmonia, do amor: o mundo divino. Mesmo que, de quando em vez, surjam algumas sombras, estas não durarão muito; desde que mantenhais o vosso espírito corretamente orientado, chegará o dia em que não mais vos desviareis. Eis o essencial, e eu só me ocupo do essencial: para saber o resto, ide consultar quem quiserdes, mas estai cientes de que isso nunca será o essencial.

Sabei que não obtereis mais que aquilo que tiverdes previamente preparado. Sim, é matemático. Se tiverdes, por exemplo, as três letras a, b e c, as combinações duas-a-duas que podeis fazer com elas são limitadas: ab, ba, bc, cb, ac, ca. Seis combinações, não mais. Se tendes tal qualidade ou tal defeito, tal talento ou tal lacuna, as situações que daí resultarão para vós refletirão exatamente as combinações desses elementos, sendo inútil esperar outra coisa.

É deste modo, aliás, que se explica a questão da graça. Tal como é apresentada na religião cristã, esta questão não é nada clara. Tem-se a impressão de que, por capricho do Céu, uns são visitados pela graça e outros não, o que faz com que nunca se saiba como nem porque é que a graça pode abranger uns e ser recusada a outros, e isso criou uma grande confusão ou mesmo sentimentos de revolta nos cristãos. Na realidade, a graça só incide sobre aqueles que a merecem. Só que esta questão apenas pode ser realmente compreendida à luz da reencarnação, quer dizer, se admitirmos que cada ser humano recebe nesta existência aquilo que mereceu segundo a sua conduta nas existências anteriores ("Somos o retrato fiel de nossa bagagem cármica"). Àqueles que, noutras vidas, já deu provas de resistência, de nobreza, de amor, de espírito de sacrifício, o Céu concede-lhe, evidentemente, a sua graça e confia-lhe missões mais elevadas.

Para que pode servir-vos o fato de alguém vos revelar o vosso passado (você foi Napoleão, Shakespeare, etc)? Não é bom, nem do ponto de vista psicológico, nem do ponto de vista pedagógico, falar aos humanos sobre as suas reencarnações. Claro que virá o momento, no vosso processo de evolução, em que podereis ocupar-vos disso, mas primeiro tereis de ser um pouco mais desenvolvidos e senhores de vós próprios. Imaginai que alguém vos revela que tal ou tal pessoa foi o vosso maior inimigo no passado, que ela vos assassinou. Se fordes fracos, se não souberdes controlar-vos, o que é que isso poderá provocar? Tais revelações são perigosas, são suceptíveis de vos perturbar e de despertar em vós certos sentimentos que entravarão a vossa evolução (é porisso que essas coisas são mantidas no seu inconsciente pelo seu organismo!). Se fosse tão importante conhecer as suas reencarnações, por que motivo a Providência as esconderia aos humanos? Se ela os fez esquecê-las deve haver uma razão muito boa para isso, não? É, muito simplesmente, para evitar novas transgressões.

Enquanto não souberdes do mal que esta ou aquela pessoa vos fez, suportá-la-eis, ajudá-la-eis. Se o soubésseis, como vos comportaríeis? Imaginai, por exemplo, o caso de um pai ou de uma mãe que soubessem que os seus filhos tinham sido o seus piores inimigos numa outra vida. Que complicação! É preferível que não o saibam, e assim amam-nos, educam-nos e, ao liquidar as suas dívidas para com eles, pagam o seu karma. A Providência quis manter os humanos na ignorância de certas situações justamente para que eles melhor possam saldar as suas dívidas uns para com os outros. Claro que, a um ser muito evoluído, muito senhor de si próprio, pode-se revelar tudo sem perigo, mas tais seres são raros.

Aconselho-vos, pois, a deixar as vossas reencarnações tranqüilas; a sua revelação não vos trará absolutamente nada, sobretudo se for para vos dizerem que foste tal santo, tal príncipe, tal Iniciado, como o fazem certas pessoas que, para vos controlar e assim obter a vossa ajuda ou o vosso dinheiro, inventam para vós reencarnações tão magníficas que ficais extasiados... e abobalhados! Quando se lhes conta tais histórias, não é para seu bem, mas para as controlar. Se quiserdes verdadeiramente fazer o bem às pessoas vale mais revelar-lhes as suas lacunas, as suas fraquezas, que dar-lhes a volta à cabeça com o seu passado glorioso... sobretudo quando isso é falso! E mesmo que seja verdade, o essencial é aquilo que elas são presentemente e não aquilo que foram no passado. Por que é que se há-de andar sempre a falar orgulhosamente do passado? É o presente que importa, e no presente existem sempre algumas lacunas a preencher, algumas fraquezas a corrigir.

Eu sei que as pessoas não gostam de que se lhes fale nas suas fraquezas, mas isso é justamente mais uma razão para se ter a coragem de o fazer, o que prova que se é desinteressado. E é isso que faz um verdadeiro Iniciado, um verdadeiro Mestre. Quando, arriscando-se a perder a vossa amizade, ele vos dá um cutucão e vos diz coisas desagradáveis para evitar que vos transvieis, mostra-se vosso amigo, vosso verdadeiro amigo. E se não o compreenderdes, zangar-vos-eis e deixá-lo-eis... Muito bem! Que pode fazer um Mestre com alguém tão estúpido que só quer elogios e louvores? Para ver quem tem pela frente, um Mestre começará por vos falar das vossas fraquezas, e, depois de ter visto como reagis, como compreendeis, ele decidirá se deve revelar-vos maravilhas sobre o vosso passado ou sobre o vosso futuro.

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