quinta-feira, 12 de março de 2009

VOCÊ ESTÁ DEMITIDO

VOCÊ ESTÁ DEMITIDO


Stephen Kanitz - Artigo Publicado na Revista Veja, edição 1726, ano 34,
nº45, 14 de Novembro de 2001.



Você é diretor de uma indústria de geladeiras. O mercado vai de vento em
popa e a diretoria decidiu duplicar o tamanho da fábrica. No meio da
construção, os economistas americanos prevêem uma recessão, com grande
alarde na imprensa. A diretoria da empresa, já com um fluxo de caixa
apertado, decide, pelo sim, pelo não, economizar 20 milhões de dólares. Sua
missão é determinar onde e como realizar esse corte nas despesas.



Esse é o resumo de um dos muitos estudos de caso que tive para resolver no
mestrado de administração, que me marcou e merece ser relatado. O professor
chamou um colega ao lado para começar a discussão. O primeiro tem sempre a
obrigação de trazer à tona as questões mais relevantes, apontar as
variáveis críticas, separar o joio do trigo e apresentar um início de
solução

.

“Antes de mais nada, eu mandaria embora 620 funcionários não essenciais,
economizando 12 200 000 dólares. Postergaria, por seis meses os gastos com
propaganda, porque nossa marca é muito forte. Cancelaria nossos programas
de treinamento por um ano, já que estaremos em compasso de espera.
Finalmente, cortaria 95% de nossos projetos sociais, afinal nossa
sobrevivência vem em primeiro lugar”. É exatamente isso que as empresas
brasileiras estão fazendo neste momento, muitas até premiadas por
sua ::responsabilidade social::.



Terminada a exposição, o professor se dirigiu ao meu colega e disse:



-Levante-se e saia da sala.

-Desculpe, professor, eu não entendi - disse John, meio aflito.

-Eu disse para sair desta sala e nunca mais voltar.
Eu disse: PARA FORA! Nunca mais ponha os pés aqui em Harvard.



Ficamos todos boquiabertos e com os cabelos em pé. Nem um suspiro. Meu
colega começou a soluçar e, cabisbaixo, se preparou para deixar a sala. O
silêncio era sepulcral. Quando estava prestes a sair, o professor fez seu
último comentário:



-Agora vocês sabem o que é ser despedido. Ser despedido sem mostrar nenhuma
deficiência ou incompetência, mas simplesmente porque um bando de
prima-donas em Washington meteu medo em todo mundo. Nunca mais na vida
despeçam funcionários como primeira opção. Despedir gente é sempre a última
alternativa.



Aquela aula foi uma lição e tanto. É fácil despedir 620 funcionários como
se fossem simples linhas de uma planilha eletrônica, sem ter de olhar cara
a cara para as pessoas demitidas. É fácil sair nos jornais prevendo o fim
da economia ou aumentar as taxas de juros para 25% quando não é você quem
tem de despedir milhares de funcionários nem pagar pelas conseqüências.
Economistas, pelo jeito, nunca chegam a estudar casos como esse nos cursos
de política monetária.,



Se você decidiu reduzir seus gastos familiares ::só para se garantir::,
também estará despedindo pessoas e gerando uma recessão. Se todas as
empresas e famílias cortarem seus gastos a cada previsão de crise,
criaremos crises de fato, com mais desemprego e mais recessão. A solução
para crises é reservas e poupança, poupança previamente acumulada.

O correto é poupar e fazer reservas públicas e privadas, nos anos de vacas
gordas para não ter de despedir pessoas nem reduzir gastos nos anos de
vacas magras, conselho milenar. Poupar e fazer caixa no meio da crise é dar
um tiro no pé. Demitir funcionários contratados a dedo, talentos do
presente e do futuro, é suicídio.



Se todos constituíssem reservas, inclusive o governo, ninguém precisaria
ficar apavorado, e manteríamos o padrão de vida, sem cortar despesas. Se a
crise for maior que as reservas, aí não terá jeito, a não ser apertar o
cinto, sem esquecer aquela memorável lição: na hora de reduzir custos, os
seres humanos vêm em último lugar.



Carlos Ortega
Consultant - Marketing Division,
Michael Page International Brasil

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